sábado, 10 de setembro de 2016

E por que Ele mentiria?

São tantas as desilusões e decepções vivenciadas, principalmente nesse momento em que passamos por uma escassez de caráter por parte de alguns líderes políticos e religiosos, por profissionais corruptos, pais que são apenas reprodutores e amizades com interesses audaciosos.

Essas e outras situações nos levam a sermos mais incrédulos, sombrios, sozinhos e desconfiados. Não temos um questionamento racionalista, aquele que faz observações para encontrar alternativas solidificadas e construtivas. Mas, ao contrário, andamos duvidosos, cansados, isolados e sem afeto e, quando questionamos, por vezes são pensamentos vazios, ou quase um grito de socorro para suprir as nossas carências emocionais.

Há uma passagem que me chamou a atenção hoje pela manhã, enquanto eu meditava: “Deus não é homem para que minta, nem filho do homem para que se arrependa. Acaso ele fala e deixa de agir? Acaso promete e deixa de cumprir?” (Números 23:19). 
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Não pude deixar de fazer um paralelo sobre esse versículo e alguns contextos reais de nosso cotidiano. Deus se mostra aqui como Soberano, como Alto, como Sublime; Ele é O Deus, e não mais UM deus; Ele não é homem, mas Deus. Ou seja, não se assemelha ao nosso caráter tendencioso à mentira inescrupulosa, à nossa necessidade de enganar, de trair, de abandonar, de ir e não voltar, de fugir da responsabilidade, da paternidade, da manutenção e provisão.

Ele não precisa nos pedir desculpas ou perdão por erros que comete agredindo à nossa urgência de afetividade. Não precisa se arrepender de nos trair, de nos ferir, de ser corrupto.

Da mesma forma, não sendo um “homem” mentiroso e abusador, não pode deixar de agir em meu favor, em teu benefício, nem precisa se redimir das promessas que tanto me fez, e te fez, e boicotou.

O prometer dele não é a nossa prática de conquista social. Aí se mostra a diferença: é o prometer em essência e com a qual não estamos habituados.

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Que essência é essa, então? Certamente não é aquele caráter que buscamos em uma igreja, em uma religião. Esse Ser que não mente, que não deixa de cumprir, não está longe para que não possa ser alcançado. Está sim, distante da nossa compreensão, da nossa percepção e visão, não porque Ele foi embora e nos deu as costas, mas porque O procuramos em pessoas, lugares e situações, e lá Ele não está para nos suprir. Então, quem está embebecido pelo engano? Quem está naufragando na mentira?

Deixando à parte o clichê “Deus é Pai”, creio que dá para começar a refletir sobre o que isso significa. 

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

A arca e as características de um Pai

Algumas histórias bíblicas, se olhadas de forma isolada, sem a percepção de uma lição de amor e cuidado que Deus quer nos mostrar, parecem absurdas! Realmente!
Humanamente falando, e com os olhos desconfiados do século em que vivemos, não há como se aproximar, ou se identificar com os fatos ali revelados.
Uma dessas histórias é a do dilúvio, vastamente difundida, inclusive, com outros nomes e personagens culturalmente diferentes.
          Mas, o que chama a atenção na narrativa são as características paternais apresentadas, quando Deus dá o direcionamento a Noé a respeito de como construir a arca, como selecionar pares de animais e como argumentar com a sua família a respeito de fé.
            Outro ponto que merece destaque está no versículo 16, do capítulo 7 de Gênesis, em que, após toda a preparação e obediência de Noé às instruções anteriores do Pai, o próprio Deus fecha a porta da arca, quando toda a família do personagem, bem como os pares de animais selecionados entram para “navegar”. O próprio Deus fecha a porta, como mais uma característica de Pai ao proteger os seus filhos dos perigos que ficaram do lado de fora.
            Os que estavam no interior da arca, sabiam o que ocorreria do lado de fora só de ouvir falar, mas não presenciaram a olho nu os desastres que ali ocorreram. Foram poupados do extermínio e de presenciar tão grande devastação.
            Por fim, ainda posso ousar dizer que percebo a presença desse Pai na própria simbologia da arca. Para mim, aquela grande obra de madeira representa um forte abraço de proteção. Os perigos que rondavam do lado de fora, as mudanças climáticas, as acusações, os gritos, as possíveis pedradas, cuspidas, ou ataques não poderiam atingir aqueles que estavam protegidos pelos braços de um Pai que podem ser representados na figura da arca. 

            Pode parecer ousadia, mas garanto que uma nova perspectiva é dada a essas histórias, quando enxergamos nas entrelinhas o próprio Paizão narrando esses acontecimentos com entusiasmo para mostrar que Ele mesmo é O super-herói daquelas aventuras.


Gênesis 1: A preparação para a chegada do recém-nascido!

Muitos textos, principalmente os que se referem a algum aspecto religioso, ou espiritual, são tidos como mitos por muitos estudiosos. Não é o meu objetivo discutir essa questão aqui.
O que quero mostrar é como em Gênesis 1 podemos encontrar a narrativa da preparação para a chegada de um filho. Não tenho como afirmar, se Deus criou tudo em exatamente 7 dias, se levarmos em consideração a mesma quantidade de horas que temos em nossos dias. Afinal, a Bíblia fala que para Ele, um dia é como mil anos e, mil anos, como um dia (2 Pedro 3:8). Ou seja, Ele é atemporal.
O grande fato é que Deus se mostra em uma maravilhosa figura paterna ao preparar tudo para a chegada de um filho (Adão) com os mínimos detalhes para o recém-nascido.
Preparou as formas, preencheu os lugares vazios e trouxe luz numa intensidade equilibrada. Nem mais, nem menos. Ali, o Pai da criação já determinava a rotina de sono e de atividades diárias para aquele que viria, quando tudo estivesse pronto. 
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Além disso, foram preparadas pelo Pai as porções certas de água de que precisaria o seu filho prestes a chegar. Uma porção de imagens esculpidas e bem trabalhadas das quais não se cansaria Adão de admirar diariamente. Era muita beleza à vista, muita sonoridade tranquila com as correntezas de águas e um aroma muito agradável para o filho ter o mimo do cheiro de sua casa.
O chão por onde esse “menino” iria passar, era seguro, bem preparado e sem perigos. O teto era dinâmico, pois mostraria a beleza do nascer do Sol e do poente. Alimento algum lhe faltaria. Esse filho não teria necessidade de se preocupar com o que teria para o café da manhã. Não precisaria sofrer de ansiedade no final do mês, pois de nada teria falta em sua despensa.
Tédio? Jamais! Tudo era lúdico e tinha todos os brinquedos necessários para o seu entretenimento. Melhor do que bichinhos de pelúcia, Adão tinha os animais para ser a sua rotina de brincadeiras e aprendizado.
Não só preparou com cores, formas e aromas o ambiente para a chegada do filho, como mostrou aspectos da paternidade: a provisão, a proteção e a instrução, quando disse a Adão para dar nomes aos animais, além de outros ensinamentos como, por exemplo, tomar conta do jardim.
Isso tudo foi preparado para mim, para nós. Temos tudo no devido lugar, desde o momento do nascimento. As estações, o ar, a água, a história, os acontecimentos, o funcionamento do nosso organismo etc.
Tudo para sermos seguros e felizes no colo do Papai!

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Os Anjos nos acompanham

A nossa visão de quem são os anjos é, por muitas vezes, clássica, folclórica e religiosa. Pensamos ser seres de pele branca, com cabelos loiros encaracolados, com uma auréola acima da cabeça, com asas e tocando harpas.
A Bíblia fala, no livro de Hebreus 13:2, que muita gente, sem saber, já abrigou em sua própria casa anjos.
Acredito que possam ser de vários tipos, tamanhos e com cores de pele diferentes. Olhos grandes, ou puxados, usando óculos, ou com olheiras, cabelos crespos, lisos, loiros, ruivos, pretos...alguns mais altos do que os outros. Alguns mais orientais, ou mais ocidentais. Quem me garante o contrário?
O que sei com exatidão é que estão conosco e aparecem quando menos esperamos. E quando mais precisamos. Falam aquelas palavras de consolo que queremos ouvir para ajudar a enxugar as lágrimas. E falam, também, aquilo que não gostaríamos de ouvir, mas que servem como puxões de orelhas, como forma de ajustar o nosso caminho.
Oferecem o colo. O afago. Mencionam o nosso nome no diminutivo, ou apelidos para mostrar empatia e carinho, ou algo do tipo: Estou aqui com você!
Esses anjos são os amigos!

Fico a me perguntar se realmente não são uma personificação do cuidado divino em nossa vida. Particularmente, não conseguiria sobreviver sem tê-los como minhas muletas.
Me questiono, ainda, quando começaram a entrar em meu caminho. Nem sempre surgem em um momento em que eu precisava. Mas estão lá no momento da necessidade, pois vão construindo dia a dia uma relação de presença conosco.
Em minhas orações de súplicas nessa semana, pedi uma manifestação da presença do Senhor Deus através de algo surpreendente. Nem eu mesmo sabia o que estava pedindo: de repente uma manifestação de fogo, de vento, de gritos...sei lá! Vai saber!
E quando acho que me frustrei por não ter visto nada disso, sou surpreendido com a manifestação simples e silenciosa da presença de um amigo. Como não dizer que poderia ser um anjo enviado justamente naquele momento?
Quero continuar recebendo em minha casa esses anjos, mesmo sem saber se são realmente.  
Ser racional demais não ajuda em nada, muitas vezes! 
      

sexta-feira, 4 de março de 2016

Sorria! Você está sendo filmado (pelos céus)!


Este texto não será um espaço para uma discussão acerca das centenas de placas informando que estamos sendo filmados, por uma questão de segurança, em estabelecimentos comerciais.
Ao contrário! De um outro tipo de câmera, e de um outro ângulo, o texto tratará.
Há quem diga que a pessoa rica é aquela que tem tempo. Tempo para perceber que as crianças só são pequenas uma vez; os adultos adoecem e envelhecem; as oportunidades de enxergar grandiosas coisas em simples atitudes passam despercebidas, se não tivermos cuidado.
Ser rico é ter tempo de olhar para o céu e contemplá-lo! Ter a oportunidade de sentir a brisa suave do vento; a maresia à noite nas calçadas das praias. Ser rico é ter tempo de conversar com alguém cuja companhia faz falta.
Ser rico é sentir, da maneira que se pode.
Ter o desejo de conquistar novos “territórios”, de nunca parar, de continuar persistindo nos faz ser ricos!
Aceitar que, por mais neuróticos que sejamos, isso nos faz estar em movimento e em constante busca por autoconhecimento. Riqueza!
Ter fé! Acreditar que há alguém Maior que, independentemente das circunstâncias, nos olha; nos admira; deseja a nossa sincera amizade e a nossa entrega. Isso é ter riqueza.
Confiar que não estamos aqui protegidos pelo acaso; que não somos frutos de coincidências; que existe um propósito e um tempo determinado para tudo, bastando apenas ter sabedoria para esperar, isso é ter muitos tesouros!
Não somos marionetes! Não há um Ser fazendo de nós o que bem entende. Vivemos as nossas decisões. Tudo o que escolhermos será influência para a colheita vindoura.

Há um céu deslumbrante acima de nós. Podemos escolher olhar para ele e sorrir, em gratidão. Quem sabe estamos sendo filmados para ser capas de revistas angelicais?
 

terça-feira, 1 de março de 2016

Malala Yousafzai e a luta pela educação

         
        No mês em que se comemora o dia internacional da mulher, muitas homenagens serão feitas na mídia e nas instituições onde a data é lembrada. Diante de tantos nomes que poderiam ser expostos, diante de tantas mulheres que merecem elogios, lembranças e suas histórias divulgadas, uma que anda representando bem a classe feminina no mundo merece ser destaque.
    Malala Yousafzai (12 de julho de 1997) é uma ativista paquistanesa. É a mais nova ganhadora de um Nobel na história, posto antes ocupado pelo físico australiano Lawrence Bragg, que ganhou o Nobel de Física em 1915, aos 25 anos. Ficou conhecida principalmente pela defesa dos direitos humanos das mulheres e do acesso à educação na sua região natal, no nordeste do Paquistão. Nesta região, os integrantes do Talibã impedem as jovens de frequentar a escola e diariamente destroem os prédios escolares com explosivos, com a finalidade de impedir o acesso à educação. Além disso, o grupo extremista invade casas onde famílias possuem aparelhos de tevê, ou livros, para destruir qualquer possibilidade de aprendizado de uma ideologia que não seja a talibã. Desde então, o ativismo de Malala tornou-se um movimento internacional.
        Após várias ameaças sofridas por ela naquele território, na tarde de 09 de outubro de 2012, Malala entrou num ônibus escolar na província de Khyber Pakhtunkhwa e um homem armado chamou-a pelo nome, apontou-lhe uma pistola e disparou três tiros. Uma das balas atingiu o lado esquerdo da testa e percorreu até o seu ombro. Nos dias que se seguiram ao ataque, a adolescente manteve-se inconsciente e em estado grave. Quando a sua condição clínica melhorou, foi transferida para um hospital em Birmingham, na Inglaterra. A tentativa de assassinato desencadeou um movimento de apoio nacional e internacional.
     
         Em 29 de abril de 2013, a jovem paquistanesa foi capa da revista Time e considerada uma das 100 pessoas mais influentes do mundo. Em 12 de julho do mesmo ano, Malala discursou na sede da Organização das Nações Unidas, pedindo acesso universal à educação.
        Aqui no Brasil, em 2013, a Editora Companhia das Letras lançou a biografia da jovem e explora os ataques que sofreu enquanto ficava mais conhecida por seu ativismo em prol da educação de meninas.
      Além do livro publicado, suas frases e ousadia têm ficado cada vez mais conhecidas na internet, em blogs, redes sociais e em programas jornalísticos ao redor do mundo. Uma das mais conhecidas e impactantes, que resumem a sua missão e escolha de vida é “Uma criança, um professor, um livro e um lápis podem mudar o mundo."
         Sem desmerecer qualquer grupo, ou ativismo, cujos focos estão no desenvolvimento social, a história de vida dessa jovem, proveniente de uma cultura de extremismos, deve ser tomada como exemplo de mudança de postura e de mente, além de ser mais difundida e aplaudida. É na educação que há a possibilidade do diálogo e das mudanças. É na formação de cidadãos que há espaço para futuros cuidadores das questões mundiais.
        Cada um de nós tem uma responsabilidade em seu entorno social. Se assim não fosse, qual seria a finalidade de estarmos exatamente onde fomos colocados e ao redor das pessoas com quem convivemos? Muitas respostas podem ser encontradas com facilidade; outras necessitam de mais busca. Talvez algumas nunca serão contempladas. Mas uma coisa é certa: nossa existência não é em vão!

         Quer seja para o homem, quer seja para a mulher, ou criança, o início de todas as mudanças se dá por meio do ato de semear a educação. É uma pena que o plantio dessas sementes seja tão desvalorizado!

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

O vale da cegueira


          Existe uma grande diferença, apesar de parecer uma linha muito tênue, entre fé e religião. Crer no sobrenatural, e na necessidade de manter um equilíbrio espiritual diante da relação estabelecida com Deus, está de um lado. Na outra ponta, está a cegueira proveniente da dedicação exaustiva de vida a um sistema religioso.
           A despeito de tantas discussões em comum, ou oponentes, que circulam ao redor do mundo, vinda de ambientes científicos, religiosos ou familiares, parece haver um consenso de que o ser humano precisa de fé. Faz parte de sua natureza. Afinal, o controle da própria vida só existe enquanto estamos vivos fisicamente. Antes, ou depois disso, já não nos compete controlar. O poder passa a ser totalmente do reino espiritual.
            No entanto, embora haja essa necessidade da fé, da busca pelo equilíbrio nessa relação sobrenatural, existe um sistema que culmina em críticas produzidas de modo corriqueiro, mormente a partir do período medieval: a religião.
Conforme diz Johnny Bernardo (NAPEC – Apologética Cristã), passados mais de 130 anos da morte do alemão Karl Marx (1818-1883), “a frase pela a qual ficou conhecido – ‘a religião é o ópio do povo’ -, continua sendo explorada por pesquisadores e lideres religiosos de diversos segmentos.” Marx passa associar a religião ao ópio – uma substância alucinógena de origem asiática, pois a religião, segundo o pensador alemão, tira do homem a capacidade de compreensão, de análise da materialidade, do chão da fábrica, da periferia. Esse pensamento se dá como resultado de os pensadores europeus da metade do século XIX passarem a entender a religião como um obstáculo ao progresso científico, cultural, educacional, econômico, popular.
            Uma passagem bíblica no livro de Ezequiel 37: 1-14 representa uma visão do vale de ossos secos. Diz o autor: Então, profetizei segundo me fora ordenado; enquanto eu profetizava, houve um ruído, um barulho de ossos que batiam contra ossos e se ajuntavam, cada osso ao seu osso. Olhei, e eis que havia tendões sobre eles, e cresceram as carnes, e se estendeu a pele sobre eles; mas não havia neles o espírito. Então, ele me disse: Profetiza ao espírito, profetiza, ó filho do homem, e dize-lhe: Assim diz o SENHOR Deus: Vem dos quatro ventos, ó espírito, e assopra sobre estes mortos, para que vivam. Profetizei como ele me ordenara, e o espírito entrou neles, e viveram e se puseram em pé, um exército sobremodo numeroso.
            O vale de ossos secos simboliza exatamente o contrário do que acontece quando há um mergulho inconsequente num sistema religioso. Nesse vale, aqueles que precisavam do sopro da vida o receberam. Formaram um exército! Vida, oportunidades, missão e batalha foram concedidas. Para os que buscam a fé, o sopro do conhecimento pode ser uma dádiva!
            No vale da cegueira, no entanto, o exército que precisaria estar de pé, saindo da inércia, desce cada vez mais e se distancia da vida. Por quê? Aqui é percebida a diferença entre a ignorância que cega, que anula e engessa devido à caminhada sem questões rumo a lugar algum; e entre o conhecimento que, para muitas instituições (desde a Idade Média e, muito bem retratada em “O nome da Rosa”, de Umberto Eco) é sinônimo de “rebeldia sem causa” e descontentamento.
            Mas é muito claro que o conhecimento se assemelha à rebeldia. É a busca pela observação dos fatos e por respostas convincentes que leva alguém a sair do poderio e do domínio do sistema religioso.

            Sem delongas! 

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

A língua de Elis




Neste domingo decidi ficar em casa deitado na rede, ouvindo músicas e lendo. Um tempo para mim. Fiz um café puro, sem açúcar e olhei para a expressão de Elis Regina na capa da Revista Bravo: retrato do artista, organizada por Claudia Giudice e veiculada pela Editora Abril em 2009. Fiquei me questionando como estarrecido por uma espécie de epifania o porquê dessa expressão.
Fui pesquisar, como bom curioso, o contexto do qual surgiu a imagem e descobri que, em 1975, Elis Regina estreou uma temporada solo intitulada Falso Brilhante, com o objetivo de contar sua história, vida e carreira, sem deixar de lado as críticas à ditadura militar brasileira; o show obteve tanto sucesso que teve mais de 1200 apresentações e ficou em cartaz entre o final de 1975 e o início de 1977. Foi uma dessas aparições a oportunidade perfeita na qual a língua dela foi vista.
Para muitos de nós, estirar a língua pode ser sinônimo de má educação, falta de respeito, provocação, e, no caso de Elis, sua sempre demonstração de alegria por ser a Pimentinha da mídia. Considero a atitude da artista algo muito belo. Não por ser ela, a artista, mas por não demonstrar um comportamento “adequado” para a mídia à época, talvez.
Direcionando a minha xícara de café à boca, e admirando a capa da revista, me pus a pensar: por que não “estirar a língua” para determinados fatos, posicionamentos ou até mesmo pessoas a quem temos dado o “poder” de nos desassossegar? Criamos muitos fantasmas em nossas relações cotidianas e, se isso não bastasse, ainda convidamos esses ghosts a morar conosco, deitar em nossa rede, na nossa cama, tomar banho em nossa suíte e até tomar café em nossa xícara predileta. Com um pouco mais de distração, permitimos que usem nossas roupas íntimas, nossas meias, calcem nossos sapatos ou até mesmo façam um delicioso prato gourmet para o almoço e nos convide para degustá-lo.
Mas o que seria de nós sem eles? Não teríamos para quem “estirar a língua” e tomar de volta o que nos pertence. Que monotonia não os ter por perto! Se escrevo este texto, algo ou alguém (mesmo fantasmagórico) trouxe-me motivação.
Elis, obrigado por sua língua!


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

o Deus monstro!

        Muito facilmente encontramos pessoas que dizem não acreditar em Deus hoje em dia. Pudera! A comercialização deste Ser, e a banalização feita com o nome dele em todas as esquinas e canais de televisão dificultam qualquer mortal a decidir “gastar” tempo concebendo a imagem desta “Persona non grata”!
            Conversas com alguns que doam seu tempo e devoção a um Criador que vive de cara feia, com um cajado na mão, bravo a maior parte do tempo e com quem não se pode ter uma conversa franca foram as minhas motivações para pensar esse tema.
            O tipo de relação com Ele é folclórica! O que as instituições religiosas procuram incutir em nossas mentes desde crianças é aquele “Papai do céu que castiga”. Sim! Pune por questões que nem mesmo sabemos que existem, ou muito menos sabemos explicar.
Estamos “errados” por sentir desejos. Mas por qual motivo nascemos com desejos naturais, se nem mesmo podemos senti-los? Não devemos falar determinados segredos e intimidades para Ele, pois o patamar de santidade e distanciamento em que se encontra é muito formal e inacessível. Então por qual motivo precisamos falar com Ele em orações, senão pelo fato de criar um laço de liberdade e amizade? Não se pode questionar coisa alguma. Falar sobre partes do nosso corpo? Jamais! Haja pecados!
É bem mais fácil confidenciar o mais profundo da alma a semelhantes nossos, em vez de se imaginar abrindo o jogo para alguém que cospe fogo e fumaça pelas narinas como representação e prova de nossa pequenez.
É bem mais fácil trocar de roupas diante de íntimos nossos, do que se imaginar desnudo diante de quem pune a nudez.
É bem menos complicado se sentir filho de qualquer um que nos ofereça atenção e carinho, do que de um Ser que cruza os braços quando estamos confusos com nossos próprios pensamentos e vontades.
Ensinaram-nos a ter uma relação com um monstro!
Uma das crônicas que tentam desmistificar esse folclore é “Um deus que sorri”, de Martha Medeiros. Diz a autora no livro Liberdade Crônica, de 2014 : “Eu acredito em Deus. Mas não sei se o Deus em quem acredito é o mesmo Deus em quem acredita o balconista, a professora, o porteiro. O Deus em quem acredito não foi globalizado...Meu Deus é discreto e otimista. Não se esconde, ao contrário, aparece principalmente nas horas boas para incentivar, para me fazer sentir o quanto vale um pequeno momento grandioso...”. 
O cotidiano em si já traz pesos suficientes para suportar e leões em demasia para matar. Não há necessidade de criarmos mais monstros. Chega de domesticá-los!
É tempo de provar de um Deus que sorri!. 

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Viver é adaptar-se!



Na semana em que se comemora mais um aniversário do escritor carioca Euclides da Cunha (1866-1909), conhecido por, dentre outras obras e atuação, ser o autor de Os Sertões, obra escrita quando foi enviado ao sertão baiano para cobrir a Guerra de Canudos, uma de suas citações circula em vários sites e redes sociais: viver é adaptar-se.  
Logo me vêm à mente questionamentos acerca da consciência dessa adaptação frente aos estranhamentos da vida.  
Não é necessário ir ao Sertão do Nordeste, espaço real e físico, para perceber a necessidade da adaptação que precisamos decidir enfrentar, se quisermos evoluir e amadurecer.
O “Sertão”, o “sertanejo”, a “guerra”, a “fome”, neste contexto, podem representar imagens metafóricas para os símbolos que nos rodeiam cotidianamente. Em meio ao acelerado estilo de vida, de produtividade e competitividade, com as cabeças baixas para dar conta das informações que enchem as telas de nossos smartphones e tablets não sobra tempo para perceber o outro. Parece não haver espaço para pensar a respeito do que sente fome real, ou do que sente desejos, necessidades de ser ouvido, tocado; não nos resta tempo para perceber que alguém lá fora precisa mais do que nós daquele sapato que não nos serve mais.
Há quem padeça e desfaleça em leitos de hospitais e instituições de apoio (antigos asilos) sem receber uma visita. Nas instituições de acolhimento (orfanatos) há crianças e adolescentes diariamente olhando para o portão na esperança de encontrar um pai e uma mãe.
Mas não é necessário irmos tão longe. Ao nosso lado, ao nosso redor, há quem padeça da necessidade (consciente, ou não) de encontrar/desencontrar alguém que cuide, ou alguém de quem possa cuidar.

Parece que estamos nos esquecendo de uma vivência que está à margem, não no centro. O que é viver nessa adaptação? O que é adaptação? No momento, a resposta mais honesta é: nos fechar para a realidade, nos isolar em ilhas emocionais.