sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

A língua de Elis




Neste domingo decidi ficar em casa deitado na rede, ouvindo músicas e lendo. Um tempo para mim. Fiz um café puro, sem açúcar e olhei para a expressão de Elis Regina na capa da Revista Bravo: retrato do artista, organizada por Claudia Giudice e veiculada pela Editora Abril em 2009. Fiquei me questionando como estarrecido por uma espécie de epifania o porquê dessa expressão.
Fui pesquisar, como bom curioso, o contexto do qual surgiu a imagem e descobri que, em 1975, Elis Regina estreou uma temporada solo intitulada Falso Brilhante, com o objetivo de contar sua história, vida e carreira, sem deixar de lado as críticas à ditadura militar brasileira; o show obteve tanto sucesso que teve mais de 1200 apresentações e ficou em cartaz entre o final de 1975 e o início de 1977. Foi uma dessas aparições a oportunidade perfeita na qual a língua dela foi vista.
Para muitos de nós, estirar a língua pode ser sinônimo de má educação, falta de respeito, provocação, e, no caso de Elis, sua sempre demonstração de alegria por ser a Pimentinha da mídia. Considero a atitude da artista algo muito belo. Não por ser ela, a artista, mas por não demonstrar um comportamento “adequado” para a mídia à época, talvez.
Direcionando a minha xícara de café à boca, e admirando a capa da revista, me pus a pensar: por que não “estirar a língua” para determinados fatos, posicionamentos ou até mesmo pessoas a quem temos dado o “poder” de nos desassossegar? Criamos muitos fantasmas em nossas relações cotidianas e, se isso não bastasse, ainda convidamos esses ghosts a morar conosco, deitar em nossa rede, na nossa cama, tomar banho em nossa suíte e até tomar café em nossa xícara predileta. Com um pouco mais de distração, permitimos que usem nossas roupas íntimas, nossas meias, calcem nossos sapatos ou até mesmo façam um delicioso prato gourmet para o almoço e nos convide para degustá-lo.
Mas o que seria de nós sem eles? Não teríamos para quem “estirar a língua” e tomar de volta o que nos pertence. Que monotonia não os ter por perto! Se escrevo este texto, algo ou alguém (mesmo fantasmagórico) trouxe-me motivação.
Elis, obrigado por sua língua!


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